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pílulas do twitter
17 de abr. de 2004
Favela
favela s. f. (...) 3 Regionalismo: Brasil. conjunto de habitações populares que utilizam materiais improvisados em sua construção tosca, e onde residem pessoas de baixa renda.
4 Derivação: por extensão de sentido. Regionalismo: Brasil. Uso: pejorativo. lugar de mau aspecto; situação que se considera desagradável ou desorganizada.
[Dicionário eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa]
Em 1970 a prefeitura de São Paulo transferiu, provisoriamente, 60 famílias, da Vila Prudente para a região entre os córregos Independência e Sacomã, um improviso que resultou numa favela com mais de 80 mil moradores. Hoje, ocupando cerca de 1 milhão de metros quadrados, entre o bairro do Ipiranga e São Caetano do Sul, está a maior favela de São Paulo, Heliópolis, a "Cidade do Sol". Ainda longe de brilhar, Heliópolis enfrenta problemas estrututrais: 40% das casas não têm esgoto, mais de 60% das ruas não são asfaltadas, mais de 250 famílias moram em barracos que podem desabar com a chuva.
São 10 núcleos, onde a atuação dos traficantes é dividida entre dois principais grupos. Mas suas ruas não guardam apenas traficantes e mazelas, têm também, mais de 30 mil crianças entre 7 e 14 anos, procurando a maneira mais segura de aprender e crescer na favela.
Pensei em fazer aqui um balanço de um mês trabalhando em Heliópolis. Até há um mês atrás, conhecia alguns lugares barra-pesada de Birigui (Vila Bandeirantes) e Londrina (Jardim União da Vitória), inclusive tendo trabalhado nesses dois lugares. Assim, a realidade com a qual me deparei em Heliópolis não foi pior do que eu estava esperando. Pelo contrário, fiquei surpreso com as melhorias que lá estão sendo feitas, frutos de muitas ações de cunho estritamente político. Porém, continua sendo a segunda maior favela (ou comunidade) do Brasil, atrás somente da Rocinha.
A uns poucos prédios simples que ficam na entrada da comunidade, ouvi como referem-se a eles: "os predinhos que pegaram fogo"; o rapaz no ônibus falando que "outro dia num salão aí tava tão bebo (sic) que nem sabia se tava dançando com um homem ou uma mulher"; o treinador do Ratatá F. C. dizendo que só joga no time quem tem cabeça boa, quem faz besteira não entra; o curioso nome da rua principal, espinha dorsal da comunidade, Estrada das Lágrimas; o santuário de Santa Edwiges, a santa das causas impossíveis, o canal onde se concentram os piores barracos; a perifeira da favela, se isto é possível.
Essas observações ocorrem-me em flashes facilitadas pelos exercícios de observação participante que fazia quando estudante. Uma realidade dinâmica, que se transforma em toda interação; e mais, cujo observador também acaba por transformar-se ao observá-la e interagir com seus elementos, dignos de nota.
P.S.: A trilha sonora deste mês foi as compilações Favela Chic. Esse é o nome de um bar em Paris que toca música brasileira. Existe um clone dele aqui em São Paulo: o Favela, na Atílio Innocenti, mas eu nunca tive a oportunidade de ir. Talvez porque seja muito chique.